sábado, 25 de janeiro de 2014

Navio pirata



Um país é como um navio flutuando num imenso oceano, ao sabor do vento. E para esse destino de navegar, o navio não precisa de comando. A sua tripulação é capaz de mantê-lo flutuando por ai, mesmo durante as crises de fúria do vento, conhecidas como tempestades.

Assim mesmo, como um navio flutuante, é o Estado. Seus servidores, concursados ou terceirizados, estatutários ou não, são capacitados para manter o barco sempre navegando, pois navegar é preciso.

O eventual comando seria para dar ao navio Estado um rumo e uma direção.

No caso aqui do navio Estado da Bahia, trata-se de um barco à deriva, desgovernado, desde que Otávio Mangabeira deixou o comando do antigo paquete transatlântico, que hoje não passa de uma sucata inchada, enfeitada e de pequena cabotagem.

A partir de então, muitos oportunistas e alguns aventureiros vestiram o chapéu e a fantasia de comandante, não para dar um rumo ao navio, mas para viabilizar projetos pessoais de enriquecimento ilícito e facilitar a vida dos passageiros da primeira classe.

Para tapear os passageiros das classes inferiores, abandonados nos porões do navio e só lembrados no período eleitoral, os aventureiros e os oportunistas usam várias máscaras carnavalescas para conseguir o voto dos excluídos.

Lembro bem de um obscuro marinheiro, alçado ao comando do navio pelo poder dos canhões, que vestia uma máscara de valente, honesto, competente e trabalhador. Ele comia dinheiro público e arrotava um imenso amor pelo navio e por seus passageiros das classes inferiores. Com esse expediente, o neo oligarca conseguiu acumular imensa fortuna, da noite para o amanhecer, e se eleger e eleger seu cumpinchas e ainda se impor várias vezes para cargos de comando no país.

Mas todos os comandantes de araque, à exceção de Waldir Pires e Nilo Coelho, que ficaram muito pouco tempo no comando, todos eles mantiveram o navio à deriva e não foram homens para dar um rumo e uma direção ao vapor baiano.

Em vez disso, inventaram uma maneira eficaz de realizar obras superfaturadas, construindo estradas, escolas, hospitais, mas sem cuidar de proporcionar vida digna aos servidores públicos e serviço eficiente aos passageiros, porque pagamento de folha salarial e serviço público de qualidade não rendem propinas. As associações e sindicatos de servidores públicos deveriam bolar uma fórmula de garantir a devolução aos comandantes de 10 ou 20 por cento da folha de pagamento, porque só assim os servidores públicos passarão a receber salário decente. 

Hoje, no auge da mais aguda crise de falta de governo, só para citar apenas três absurdos exemplos de falta de comando no governo do navio baiano, o mar do recôncavo continua sendo bombardeado por falsos pescadores, destruindo um fabuloso patrimônio natural, em pleno século 21; o remanescente de mata atlântica do seu litoral, outro incalculável patrimônio em extinção, é ainda invadida, desmatada e incendiada por criminosos, encorajados pela covardia dos comandantes;  e o sistema de transporte marítimo entre Salvador e a ilha de Itaparica, que continua cobrando caríssimo para transportar gente como se fosse cachorro sem dono.

Lembro mais uma vez do mesmo obscuro marinheiro das bravatas, larápio e irresponsável comandante que, sem estudo ou planejamento algum, mas por mero impulso eleitoreiro, abriu as comportas do dinheiro público, supostamente para o público, e comprou para o sistema ferry boat uma lancha muito rápida e confortável, do tipo over marine, gabando-se demagogicamente de que os ricos iam morrer de inveja dos pobres viajando numa embarcação de primeiro mundo.

Em pouco tempo de operação, a lancha caríssima se mostrou inadequada para as condições de navegação na baia de Todos os Santos e foi sorrateiramente vendida como sucata e não se falou e nem se fala mais nisso.

Hoje, eu prefiro ser essa metamorfose ambulante e me transformar num boi, num curral com uma boiada, do que ser passageiro humilhado nos cacetes armados das estações de passageiros, semelhantes a campos de concentração para longas esperas, e agredido pelo serviço de transporte público, prestado pelas concessionárias do sistema ferry boat.

O pior de tudo é que sabe-se que existe um acordo espúrio e lucrativo para empresários e políticos comandantes, feito entre o governo e a atual concessionária do ferry boat, para que ela faça seu serviço de qualquer maneira, sem obedecer horários ou quaisquer outras regras de segurança, de qualidade e de eficiência e cobre da sub-boiada o quanto quiser, pois não haverá fiscalização, nem punição alguma por parte do abúlico comandante do vapor baiano.

Nos últimos messes, pouquíssimas viagens dos novos navios negreiros do sistema ferry boat foram feitas no horário estabelecido, prejudicando ainda mais as vítimas desse transporte infame.

Para o bem de todos e felicidade geral da pré-boiada, seria bom que a agência reguladora divulgue quantas multas foram aplicadas e pagas pela concessionária, no ano de 2013 e no começo deste ano. 

Mas isso é exigir muito dos piratas e do navio pirata. Eles estão armados e nós estamos desarmados e sequestrados. Como se diz na gíria, estamos comidos e mal pagos.

Durante a fase militar da ditadura do terrorismo capitalista, escrevi e publiquei no livro Amarelo de fome, verde de medo os versos que transcrevo em seguida, porque, decorridos mais de meio século, quase nada mudou em nossas vidas e os versos continuam como se estivessem saindo do forno, ou do “pau-de-arara”.

Caso a realidade do navio onde você vive seja semelhante à realidade do vapor baiano e você também está retado com os políticos, com os governos, com a “justiça”, com a falta de segurança, com a corrupção, com a merreca do seu salário, que acaba antes do fim do mês e com os juros que você paga aos bancos, para poder continuar se alimentando até o próximo salário, então, faça como eu, vote nulo!

Seja como eu
um ateu cívico
não acredite em reinos
nem em monarcas
com ou sem soberania

não acredite em ministros
em políticos
tecnocratas
nem em índices de governo,
mas reaja com simpatia

Seja um discreto
violador
de hinos e bandeiras.
cante samba nas paradas
faça carnaval a vida inteira.

E se você for dado
ao cheiro de uma fruta
e gosta de esfregar
o aroma em suas narinas, 
faça sempre isso em casa,
como se estivesse
ao pé da árvore
na beirada de um regato
ao sabor da brisa
sibilante
ou murmurante
como na linguagem
dos regatos
de poesia

Ou seja bem ousado
imagine tudo isso
plantado em terra sua
(e não na do cigarro)

Isso tudo
para não ficar por aí
curtindo o sabor das coisas
num tremendo cercado de cimento
sob a pressão
dos apelos 
de mendigos
de políticos
de anúncios
e de letreiros

e do barulho
das boiadas mecânicas
em atravancado estouro
rotineiro

Eu sou assim
não me arrependo

Vivo e encaro
minha miséria
com profético desdém

faça isso você também.

Não viva como os crédulos
uma vida angustiada
expelindo do bucho
um hálito azedo de azia e álcool.

Faça como eu
conserve em sua boca
um odor saudável
e com seu sorriso mais sincero
ofereça
sem receio
beijos à sua mulher
no sabor inquestionável
inconfundível
imperial
do mais puro e genuíno
creme dental
multinacional

que solta
tinta da rosca
e suja a pasta
de preto.














sábado, 18 de janeiro de 2014

Tiro ao alvo.


Pão e circo

o pão não nos dão
nós fazemos e não comemos
mas temos circo e o nosso circo
são vocês

o palhaço (a vossa platéia) somos nós
porque somos os eleitores de vocês.

Mas circo nós não somos
o nosso circo são vocês

e nesse circo de reino ocupado
o jogo é fazer lei
o dono apita de fora, a platéia sorri e chora
o bobo da corte é o rei.

Desde a invasão européia no século 16 e depois de mais de 5 séculos de exploração do capitalismo econômico e financeiro internacionais, mais de setenta por cento da população brasileira continua dopada, chapada e mantida abaixo da linha da miséria em alimentação, instrução, informação, conhecimento, educação e saúde.

Sequestrada e aprisionada pela plutocracia e castigada com trabalhos forçados, a maioria do povo brasileiro continua na miséria, na pobreza, no medo, no desamparo e no sofrimento, enquanto a minoria patronal dilata sua pança com a usura do lucro predador da dignidade e do meio ambiente, alimentando-se do sangue, do suor e das lágrimas do trabalhador.

Mas é assim que funciona e se sustenta o terrorismo do capital, acorrentando na miséria os países colonizados, por mais ricos que eles sejam em recursos naturais.

A partir do ano 1500, último ano do século 15, e daí em diante, a política econômica imposta ao Brasil por sua malfadada e incompetente elite dirigente de rapina é a política de exportar produtos primários, à preço de banana, e importar produtos manufaturados e industrializados, pagos a peso de ouro, com o suor, o sangue e as lágrimas dos brasileiros, seja na ditadura imperial, na ditadura militar, ou na ditadura republicana.

Toda a miséria humana existe somente para que a minoria patronal lucre cada vez mais, concentrando riqueza, depredando os campos e as cidades, como degenerados gigolôs do dinheiro, da terra, do gado, das riquezas naturais e do trabalho alheio.

Também aqui no Brasil - colônia dos Estados Unidos, que por sua vez é colônia dos banqueiros judeus, donos do Federal Reserve, (o Banco Central norte americano) -  um punhadinho de vândalos nativos, feitores da Casa Grande de Wall Street, entrega e controla para os seus patrões estrangeiros, o Estado, o executivo, o legislativo, o judiciário e os meios de comunicação de massa, para manter no país a mesma política econômica implantada no século 16 e para reprimir e para chamar de “vândalos”, de “hereges” ou de “terroristas” as pessoas esclarecidas, que se insurgem contra esse terrorismo capitalista, castigando os insurgentes com prisão, tortura e assassinato, exatamente como se fazia na idade média,  ou com tudo isso e mais gás pimenta, balas de borracha, e bombas de efeito imoral, como se faz nos dias atuais.

Abúlica, letárgica, mal formada, a maioria do povo oprimido assiste sonolentamente a destruição impune dos nossos rios e florestas, o envenenamento dos nossos mananciais, a poluição do ar que respiramos, a degradação das cidades, a  devastação das terras, investindo no poder, com o seu voto cego, ou com a sua omissão conivente, políticos, burocratas, dirigentes mercenários, que vendem o seu voto parlamentar, suas sentenças e suas sanções presidenciais, para entregar o país ao sistema financeiro internacional, assegurando maioria parlamentar para essa minoria espúria, que se fortalece sugando o sangue dos trabalhadores.

Lá em cima estão versos que escrevi durante a ditadura militar, logo no comecinho daquelas décadas de triste memória, e como nada mudou, eles continuam atuais e os repito aqui em baixo dessas linhas, para lembrar aos novos insurgentes revolucionários, que o alvo de nossa revolta contra o terrorismo do capital, não deve ser inocentes nas ruas, nos ônibus, nas escolas ou nos templos religiosos, nem deve ser o patrimônio público,  mas, sim, os bancos e os banqueiros assassinos, que ordenam e financiam as guerras, as invasões e a ocupação de países soberanos com as armas e os soldados de seus países vassalos e que golpeiam os brasileiros necessitados com juros de mais de quatrocentos cinquenta por cento ao ano.

Pão e circo

o pão não nos dão
nós fazemos e não comemos
mas temos circo e o nosso circo
são vocês

o palhaço (a vossa platéia) somos nós
porque somos os eleitores de vocês.

Mas circo nós não somos
o nosso circo são vocês

e nesse circo de reino ocupado
o jogo é fazer lei
o dono apita de fora, a platéia sorri e chora
o bobo da corte é o rei.

(no livro “Amarelo de fome, verde de medo”, publicado em 1975)