sábado, 28 de janeiro de 2012 | 08:30
Pepe Escobar (Asia Times Online)
No discurso “O Estado da União”, esta semana, o presidente dos EUA Barack Obama disse: “Que ninguém duvide: os EUA estamos determinados a evitar que o Irã chegue à bomba atômica, e não excluirei de sobre a mesa nenhuma opção para atingir aquele objetivo.”
No mundo real, a frase significa que Washington quer ir à guerra – a guerra econômica já está em curso – contra um país que assinou o Tratado de Não Proliferação Nuclear e não está construindo armas atômicas, como já declararam a Agência Internacional de Energia Atômica e a mais recente US National Intelligence Estimate.
Obama também disse que “o regime de Teerã está mais isolado do que nunca; seus líderes sofrem sob o peso de sanções paralisantes, e, enquanto fugirem às suas responsabilidades, a pressão não diminuirá.”
“Isolado?” Não, não. O Irã não está isolado. Nem, tampouco, é a liderança iraniana que sofre sob o peso de sanções paralisantes: quem sofre é a absoluta maioria de 78 milhões de iranianos pobres.
Em declaração antes do discurso, Obama “aplaudiu” a decisão da União Europeia de impor embargo contra o petróleo do Irã, e acrescentou que “Aquelas sanções demonstram, mais uma vez, a unidade da comunidade internacional”.
OK. Mas a tal “unidade da comunidade internacional” é composta de EUA, países da OTAN, Israel e o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG, também conhecido como Clube Contrarrevolucionário do Golfo); o resto do mundo é miragem.
Venha para o programa petróleo-por-ouro. Dois países Brics, Índia e China, juntos, compram pelo menos 40% do petróleo que o Irã exporta, 1 milhão de barris/dia. 12% do petróleo de que a Índia necessita. E a China comprou, ano passado, 30% mais petróleo do Irã que em 2010, média de 557 mil barris/dia.
A “comunidade internacional” de verdade já está tomando conhecimento de que a Índia começará a pagar em ouro, pelo petróleo iraniano – não com rúpias, através do banco estatal UCO indiano e do banco estatal Halk Bankasi, turco.
Pequim – que já negocia com o Irã em yuans – pode também mudar-se para o ouro. Desnecessário lembrar que ambas, Delhi e Pequim, são grandes produtoras de ouro, com muito estoque nos cofres. Assim, o Ano do Dragão começará com muito barulho: pode bem ser o padrão-ouro do Ano do Dragão.
Todos recordam o fracassado programa da ONU petróleo-por-comida, que matou de fome os iraquianos, nos anos antes da invasão/ocupação dos EUA, em 2003. Iraquianos médios pagaram preço terrível pelas sanções de ONU/EUA, e o programa petróleo-por-comida só beneficiou o sistema de Saddam Hussein.
Agora, o negócio é muito mais sério; é o programa petróleo-por-ouro, iniciativa de Brics + Irã que beneficiará a liderança da República Islâmica e talvez alivie os efeitos das sanções sobre a população iraniana. Consequências globais: a cotação do ouro sobe; o petrodólar cai.
Outro país Brics, a Rússia, já negocia com o Irã em rials e rublos. E a Turquia, aspirante a membro do grupo Brics – e que também é integrante da OTAN – não acompanhará as sanções de EUA/União Europeia, se não forem impostas pelo Conselho de Segurança da ONU (não-não, porque Rússia e China, membros permanentes, vetarão).
Em dois meses, o primeiro-ministro Vladimir Putin – que enfurece/apavora Washington e Bruxelas como um neo Vlad o Impalador – estará de volta à presidência da Rússia. É quando os poodles atlanticistas saberão o que é jogo à vera.
Enquanto isso, Teerã jamais se curvará às sanções ocidentais – muito menos com vários mecanismos laterais/subterrâneos já implantados para vender seu petróleo e que envolvem três países Brics mais dois aliados dos EUA, Japão e Coreia do Sul, os quais, provavelmente, conseguirão que o governo Obama os isente de cumprir as sanções.
Dado que isso tudo jamais teve algo a ver com uma inexistente arma nuclear, a liderança em Teerã só terá de seguir um parâmetro supremo de estratégia: não cair em provocações ou em arapucas de operações clandestinas sob falsas bandeiras, que serviriam como casus belli para um ataque de guerra do eixo EUA/Grã-Bretanha/Israel.
E tudo isso, enquanto tendências no horizonte – sobrecarregado – apontam para o que se pode chamar de “Zona Asiática de Exclusão do Dólar”, a qual, para muitas mentes espertas no mundo em desenvolvimento, pode pavimentar a estrada para uma moeda lastreada em energia, a ser usada pelos Brics e pelo Grupo dos 77 (G-77) para resistir ao cada vez mais desesperado – e sem rumo – ocidente atlanticista.
De volta ao congresso dos poodles europeus, basta examinar a declaração conjunta distribuída por aqueles fenômenos de mediocridade – o primeiro-ministro britânico David Cameron, a chanceler alemã Angela Merkel e o neonapoleônico “libertador da Líbia”, o francês Nicolas Sarkozy. O trio disse que “nada temos contra o povo iraniano.”
Os iraquianos ouviram exatamente a mesma frase de outro grupo de mediocridades em 2002 e 2003. Em seguida, o Iraque foi invadido, ocupado e destruído.
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